História do Bixiga
O mais tradicional bairro de São Paulo está muito acima das delimitações do distrito da Bela Vista. O Bixiga luta diariamente por sua sobrevivência cultural e para manter a sua história viva. Terra da Esperança, foi para cá que os negros vieram quando fugiram dos açoites e os italianos quando fugiram da fome ou da guerra. Juntos, construíram uma nova comunidade.
Poderia ser somente mais um bairro, mas o Bixiga tem identidade própria. Aqui tem macarrão com samba e todo mundo fala com as mãos.
Uma pátria dentro da maior cidade do Brasil, de gente que ama e sente orgulho desta terra de tantos encantos e de tanta história.
Foi no Bixiga que surgiu a primeira cantina da cidade de São Paulo e nossas padarias centenárias até hoje fazem o mesmo pão artesanal com a receita trazida da Itália. A festa de Nossa Senhora Achiropita é uma das maiores festas da cidade e nossa escola de samba, a Vai-Vai, é a maior campeã do carnaval paulista.
Nos anos 50 o bairro era conhecido como a Broadway Paulistana. O italiano Franco Zampari fundou o TBC, Teatro Brasileiro de Comédia, e o Bixiga tornou-se o palco de uma das mais importantes revoluções nas artes do país: foi aqui que nasceu o teatro moderno brasileiro.
Adoniran Barbosa, quando chegou, se identificou tanto que adotou e foi adotado pelo Bixiga. Ele tornou-se um símbolo do bairro. O casamento foi tão perfeito que nem a morte do artista conseguiu separar.
Walter Taverna, um dos maiores guerreiros na luta pela defesa das tradições e progresso do bairro, colocou o nome do Bixiga no Guinness Book ao criar o maior bolo de aniversário, junto com seu amigo Armandinho, o maior pão e a maior pizza do mundo.
Nos anos 70, assim como os negros e os italianos, esse foi o bairro escolhido por muitos nordestinos que vieram para São Paulo em busca de uma vida melhor.
E esse sangue quente que corre nas ruas do Bixiga fez com que o bairro marcasse seu nome da história do rock revolucionário dos anos 80. A casa noturna Madame Satã causou impacto nas estruturas sociais da época. Nasi, do grupo Ira! nasceu na rua Treze de Maio e os integrantes dos Titãs estudaram no colégio Equipe, que era situado na rua Martiniano de Carvalho.
O Bixiga é essa mistura toda, da tradição à quebra de paradigmas, da luta pela preservação de sua história à abertura de seu coração para todos que queiram se inserir e fazer parte dessa história.
Venha ver o samba amanhecer, venha comer as melhores massas, venha visitar nossos teatros, venha conhecer nossa feira, nossos monumentos históricos, venha receber a benção da mãe Achiropita ou venha simplesmente caminhar em nossas ruas e descobrir os encantos do bairro mais tradicional de São Paulo.
Vem pro Bixiga!
“O Bixiga é um estado de espírito” – Armandinho Puglisi.
História
01 de Outubro de 1878 – o Bixiga nasce para o mundo.
O jornal “A Província de São Paulo” publica na edição nº 1084 que o imperador D. Pedro II estaria presente na solenidade de início das obras de um novo hospital de caridade nos Campos do Bexiga.
O português Antônio José Leite Braga ofereceu parte de seu terreno na Chácara do Bexiga para a Irmandade da Santa Casa de Misericórdia em agradecimento à cidade que tão bem o acolheu. Um evento foi realizado na terça-feira 01 de outubro de 1878 para formalizar a doação e o imperador colocou uma pedra bem na esquina das atuais ruas Santo Antônio e Major Diogo para simbolizar a mudança daquelas terras, que deixariam de ser uma chácara para tornarem-se um bairro.
O hospital acabou não sendo construído, devido ao alto custo para nivelamento do terreno e pelo mau cheiro devido à proximidade com o matadouro público, mas a partir deste evento lotes de terrenos baratos e de vários tamanhos começaram a ser vendidos nas terras do Bexiga.
Os italianos estavam chegando no Brasil. A Europa estava em plena revolução industrial e não havia emprego para todos. Muitos trabalhadores estavam passando fome e o Brasil estava precisando de mão-de-obra.
A princípio os imigrantes vieram para trabalhar em lavouras, mas muitos perceberam condições melhores na capital e se interessaram pelas terras do Bexiga, as quais podiam pagar. Começou então a ocorrer um grande povoamento da região. Casas começaram a ser construídas e a prefeitura começou a criar ruas. A antiga chácara do Bexiga tornou-se o bairro do Bixiga, com “i”, como os italianos pronunciavam.
Só que os imigrantes não foram os únicos e nem os primeiros a habitar essas terras. Nas margens do Rio Saracura muitos negros já viviam por aqui, fugidos de fazendas e de leilões de escravos que ocorriam no Vale do Anhangabaú. Após a abolição da escravatura, muitos outros negros vieram recomeçar suas vidas no Bixiga.
Tanto italianos quanto negros estavam carentes de pátria e precisavam recomeçar suas vidas. O Bixiga estava nascendo como comunidade e adotou a todos. Era a Terra da Esperança.
No final do século XIX São Paulo ficou conhecida como “cidade de italianos”. A capital estava em pleno progresso e os imigrantes não paravam de chegar. Em 1872 a cidade tinha 31 mil habitantes e em 1900 o número já era superior a 240 mil, sendo mais da metade dessa população composta por pessoas vindas da Itália.
No Bixiga mais de 70% dos moradores eram italianos. Os primeiros que aqui chegaram compraram terras por um bom preço e foram vendendo parte de seus lotes para outros patrícios. Muitos foram trabalhar nas fábricas do Brás, mas outros ganhavam a vida com atividades que já desenvolviam na Itália como alfaiates, sapateiros, engraxates, mestres de obras, barbeiros, padeiros e cantineiros.
Os negros, na época, representavam 30% da população do Bixiga. Após tornarem-se livres, aos poucos foram saindo da encosta do Rio Saracura e foram se misturando com os italianos. Trabalharam juntos e foram se socializando. Era comum ver negros falando com as mãos e imigrantes fazendo batucadas.
O nome “Bixiga”
O que se pode afirmar é que ninguém sabe exatamente porque essas terras ficaram conhecidas como Bexiga, mas existem algumas hipóteses a respeito do nome.
Matadouro: A primeira é que o nome se deu por causa do comércio de bexigas do matadouro da cidade, que ficava na atual Rua Santo Amaro. Os vendedores compravam as bexigas e as revendiam em carrocinhas pela cidade.
Varíola: A segunda hipótese é que essas terras foram usadas para abrigar e isolar vítimas de varíola, doença conhecida por deixar marcas em formato de bexigas na pele. Não existe nenhum registro histórico sobre nenhum abrigo desses doentes nessas terras, mas muitos acreditam nesta versão.
Antônio Bexiga: E a terceira hipótese é que o nome se deu por causa de um dos muitos donos das terras, senhor Antônio Bexiga, que foi proprietário em 1819. A casa do Senhor Bexiga ficava onde hoje é a Rua Santo Antônio e tinha quartos que eram alugados para viajantes.
Existe um documento, mais precisamente uma relação de sepultamento que diz que em 13 de junho de 1857 faleceu em São Paulo o senhor Antônio Bexiga, deixando a quantia de 100$000 de esmola para a Ordem Terceira, o que leva a concluir que Bexiga era o seu verdadeiro nome.
Para afastar a lembrança negativa que o nome Bexiga trazia da varíola, os moradores passaram a chamar o bairro de Bixiga, mas esse também era o jeito que os italianos pronunciavam.
Cortiços
Os primeiros italianos que aqui chegaram, compraram terras e foram construindo suas casas. Para fazer uma renda extra, eles moravam em uma parte do imóvel e alugavam os demais cômodos para outras famílias.
Como todos dividiam os espaços, desde banheiro até tanques, havia muitas brigas, mas eles faziam as pazes rapidamente. Acabavam se comportando como uma grande família e no fim todos se ajudavam.
A refeição básica na época era macarrão com feijão e de vez em quando uma carne. Aos domingos as famílias trocavam comida, geralmente um prato de macarrão por um pouco de vinho ou um pedaço de pizza por uma porção de sardela.
Comida
O italiano se socializou com o paulista através da comida.
Cantina, na Itália, é o local onde se faz ou se guarda vinhos e que aqui conhecemos como adega. Os restaurantes onde se servem pratos da cozinha italiana são chamados de Trattoria.
Aqui no Bixiga, quando os imigrantes começaram a montar seus pequenos estabelecimentos, as cantinas eram lugares onde os homens se reuniam para beber e jogar bocha.
A família Capuano, dona da cantina mais antiga de São Paulo, foi a primeira a começar a servir comida, atendendo a pedidos dos próprios frequentadores.
Aos poucos as demais cantinas também começaram a arrumar mesas e a servir os belos pratos da gastronomia italiana, transformando-se em trattorias. Mas o nome cantina ficou enraizado na mente dos paulistanos.