Casarão do Madame comemora 34 anos
Hoje o casarão mais undergroud de São Paulo completa 34 anos. No dia 21 de outubro de 1983, o clube Madame Satã abria suas portas na esquina das ruas Conselheiro Ramalho e Fortaleza para escrever seu nome na história. A casa marcou época porque foi um local onde as pessoas se reuniam não só para ouvir boa música como também para exercitar sua liberdade de ser.
O Madame Satã era frequentado por uma galera alternativa e diversificada. Inacreditavelmente pessoas com as mais diferentes ideologias conviviam pacificamente neste local. Muitos artistas, músicos, jornalistas, intelectuais dividiam espaço no balcão com punks, carecas, darks e até mesmo com socialites e gays, que até então viviam apenas em seus próprios guetos.
Grandes nomes do rock nacional já tocaram no Madame como Titãs, Ira!, RPM, Inocentes e também da MPB, como Arrigo Barnabé. A casa já foi cenário de filmes e palco das mais diversas manifestações culturais. Hoje sob o comando de Gé Rodrigues e com seu nome reduzido para Madame, a casa segue em seu eterno casarão tombado no Bixiga, patrimônio material e imaterial da noite e da cultura paulistana.
“Estou à frente do Madame. Minha história lá começou em 1985, quando eu era office-boy da revista Fanzine (que era do Madame) e hoje eu sou proprietário. Estou ai levantando a bandeira do undergroud, não deixando a nossa cultura cair”, diz Gé Rodrigues, que começou sua carreira de DJ aos 13 anos no próprio Madame, quando um DJ faltou e ele acabou assumindo os discos.
E o Madame convida: “Vamos voltar no tempo e reviver todas as histórias do antigo Madame Satã, onde tudo começou”.
Como a casa surgiu:
Willians e Wilson, proprietários originais do Madame, participavam de grupos de teatro ligados à igreja. Para custear os custos das peças que produziam, decidiram montar um local para a realização de eventos culturais que gerassem renda. Wilson achou um casarão abandonado na Rua Conselheiro Ramalho que seria perfeito. Para bancar a reforma do local, membros do grupo de teatro contribuíram com cotas de dinheiro.
Numa lista com aproximadamente 40 nomes para o espaço, estava o codinome de João Francisco dos Santos, famoso artista da contracultura brasileira, mas todos tinham certo receio do que essa denominação poderia causar. O grupo então foi para a frente do Teatro Municipal fazer uma pesquisa e através das respostas deste questionário descobriram que o nome seria bom porque despertava a curiosidade das pessoas: “o que é Madame Satã?”
Quem descreve o casarão diz que era tudo muito esquisito. Logo ao entrar, a pessoa avistava um salão grande de madeira que fazia muito barulho e um bar onde as pessoas mais diferentes ficavam conversando. No porão havia a cabine do DJ, a pista e um palco improvisado onde as bandas se apresentavam. Outro espaço marcante era a lendária banheira, onde a artista Cláudia Wonder tomava seu banho de sangue (groselha).
A música era completamente diferente dos outros lugares. Tocava coisas que não se ouvia no rádio. Os DJs traziam muitas novidades de fora do país, como rock inglês alternativo. E era também muito eclético, pois tocava desde punk à MPB. A casa também foi palco para o lançamento de grandes nomes da música nacional. O lugar tornou-se tão famoso que recebeu até mesmo a visita de Manoel Poladian, empresário de Roberto Carlos, a convite de Ney Matogrosso.
E como resposta talvez se possa dizer que foi um lugar undergroud, democrático onde as pessoas podiam ser livres para ser o que quiserem. Lema do Madame Satã: “quem é diferente é diferente”.
Quando o Madame Satã caiu na mídia, no começo dos anos 90, o público original migrou e a casa mudou. A nova administração da casa fez do espaço um reduto gótico e mudou o nome. Em 2011 o casarão volta para as mãos de quem viveu toda essa história. Gé Rodrigues torna-se proprietário do espaço e reabre com a proposta de manter viva a chama desta casa que marcou uma geração. Vida longa a esta senhora da noite, templo do underground e da liberdade em SP.